segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Texto de Platão sobre a Escrita

SÓCRATES - Ouvi dizer que havia perto de Naucratis, no Egipto, um daqueles velhos deuses a quem os Egípcios consagravam uma ave chamada Íbis [que] tinha o nome de Theut; foi ele o inventor da aritmética e do cálculo, da geometria e da astronomia, o jogo do xadrez e dos dados, mas a sua grande descoberta foi a escrita. Tamuz, também por eles chamado Amon, reinava sobre toda a região, na cidade do alto Egipto a que os gregos chamam Tebas egípcia. Theut veio ao encontro do rei e exibiu perante ele as suas artes dizendo ser conveniente ensiná-la aos habitantes do Egipto. O rei indagou qual seria a utilidade de cada uma delas e ora as criticava, ora as elogiava, segundo lhe pareciam bem ou mal realizadas. Seria fastidioso repetir tudo aquilo que Tamuz disse a Theut, quer louvando quer censurando cada uma dessas artes. Mas quando chegou a vez da escrita, disse Theut: 'Aqui está, ó rei, algo que permitirá aos Egípcios tornarem-se mais sábios e dar-lhes uma memória melhor; pois eu encontrei o remédio tanto para a memória como para o engenho.' O rei respondeu-lhe: 'Ó Theut, mestre incomparável! Nem sempre o pai ou criador de uma arte é o melhor juiz acerca da utilidade ou inutilidade das suas invenções para os que serão seus utilizadores. Neste caso, sendo tu o pai das letras, por amor às tuas criaturas, foste levado a atribuir-lhes uma qualidade que elas não possuem: é que esse teu invento vai originar o esquecimento nas almas dos aprendizes, já que eles, sabendo escrever, deixarão de exercitar a memória; pelo contrário, confiarão nos caracteres escritos externos e não se lembrarão já por eles próprios. O que tu descobriste tem o condão de ajudar não a memória mas a recordação; portanto, ensinas aos teus discípulos não a verdade, mas a aparência da verdade: eles serão ouvintes de muitas coisas, mas não terão aprendido nada; parecerão ser muito cultos, embora sejam ignorantes na maior parte das coisas” (Platão, in Fedro 14 (274b-277a))

2 comentários:

Maria José Vilas Boas disse...

Este texto foi um dos que tive que estudar para uma frequência de Teoria da Comunicação. Muito interessante!

Ana Isabel Lopes disse...

Olá Maria!

Eu também o estudei :). Curioso, não??

Beijinho